Preocupada com o delicadíssimo momento institucional que o Brasil vive, a presidente do STF, ministra Carmen Lúcia (foto de capa), definiu como primeiro item da pauta da sessão desta quarta-feira a decisão liminar do ministro Marco Aurélio Mello de afastar Renan Calheiros da presidência do Senado. Ordem esta, como se sabe, olimpicamente descumprida pelo notório senador. Para um leigo, a votação de hoje seria meio que um Fla x Flu: ou os colegas aptos a votar (Luiz Barroso declarou-se impedido por ter sido sócio de um dos advogados de Renan; e Gilmar Mendes está viajando pela Europa! Significa que nove ministros vão participar da sessão desta tarde) concordam com Marco Aurélio ou discordam. No primeiro caso então, o senador, pelo menos em tese (depois do que aconteceu na terça, tudo passa a ser teórico), seria afastado do comando da Casa por decisão colegiada. No segundo, o despacho liminar seria derrotado e Renan continuaria alegremente na presidência.
Mas já há quem fale na possibilidade de uma solução salomônica, retirando o senador da linha sucessória presidencial, mas mantendo-o no cargo de presidente do Senado! Segundo a jornalista Mônica Bergamo, colunista da Folha de S. Paulo, já haveria um acordo entre STF e Senado neste sentido. Cinco ministros já teriam declarado que votarão por este encaminhamento depois que Dias Toffoli apresentar esta tese. Símbolo da corrupção e do coronelismo que ainda imperam na política do sul do mundo, Renan Calheiros, ao que tudo indica, vencerá mais esta. E o Brasil sai novamente perdendo se ele permanecer à frente da Casa.
ENTENDIMENTO
Marco Aurélio Mello baseou seu despacho em entendimento que já existe por maioria do próprio Supremo, dando conta de que réus não podem estar na linha sucessória, ou seja, nas presidências da Câmara, do Senado e do próprio STF. A corte analisa esta tese e seis magistrados (a maioria dos 11, portanto) já registraram votos favoráveis. Só não houve uma solução definitiva porque Dias Tóffoli pediu vistas levando a matéria à gaveta. Renan virou réu semana passada, nove anos depois do escândalo segundo o qual a Mendes Junior pagava a pensão de uma filha dele fora do casamento.
CONTROVÉRSIA
A canetada de Marco Aurélio Mello vem gerando muita controvérsia nos meios jurídicos e políticos. Há quem veja no posicionamento do magistrado o mais absoluto amparo constitucional. Na outra ponta, estão pipocando variadas críticas ao despacho do magistrado. O blog reproduz parte de um texto do jurista Lenio Streck, publicado no site Consultor Jurídico, especializado em questões judiciais. Confira:
“De fato, hoje mais uma vez ficou demonstrado o extremo ativismo do STF, contra o qual eu achava que o ministro Marco Aurélio estava imunizado. Mas, não. Na decisão, o ministro fala das manifestações de rua: “O Senador continua na cadeira de presidente do Senado, ensejando manifestações de toda ordem, a comprometerem a segurança jurídica”.
Ora, a Suprema Corte não é porta voz do povo. Ao contrário: nela temos que ver a garantia contra maiorias exaltadas. A Constituição é o remédio contra maiorias. E o STF deve ser o guardião da Constituição. Quem disse que a voz das ruas tem legitimidade? Somos duzentos milhões de habitantes e menos de 400 mil foram às ruas. Isso é fundamentação? Cadê a Constituição? Aliás, no HC 126.292 o próprio ministro Marco Aurélio disse — sabiamente — que a decisão sobre a presunção da inocência não poderia ser dada ao sabor da voz das ruas. E agora, ministro?”