Evento promovido pelo Núcleo de Ações Repetitivas de Assistência à Saúde reuniu procuradores do Estado e operadores jurídicos na Esmesc nesta quarta-feira, 4
Aconteceu ao longo desta quarta-feira, 4, o V Ciclo de Palestras do Núcleo de Ações Repetitivas de Assistência à Saúde (Naras) da Procuradoria-Geral do Estado, evento organizado em parceria com a Unimed Grande Florianópolis, que discutiu os Dilemas públicos e privados do fenômeno da judicialização na saúde. Cerca de 120 procuradores do Estado, magistrados, servidores públicos e operadores jurídicos da área da saúde se reuniram na Escola Superior da Magistratura do Estado (Esmesc), no bairro Itacorubi, em Florianópolis, para acompanhar três painéis que discutiram temas como fraudes na saúde, o cuidado com indivíduos dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA) e novos modelos de desjudicialização na esfera da Saúde.
Com 16 palestrantes ao longo do dia, a quinta edição do Ciclo de Palestras buscou discutir as possibilidades de conciliação e redução de litigância na área da saúde, que hoje é responsável por um grande volume de processos em tramitação no judiciário catarinense. A mesa de abertura reuniu os procuradores do Estado Thiago Aguiar de Carvalho, coordenador do Naras, e Fabiana Guardini Nogueira, procuradora-chefe do Cest, além do presidente da Unimed Grande Florianópolis, Jalmir Aust. Também compuseram a mesa a coordenadora do Comitê Estadual de Saúde, juíza Cândida Inês Zoellner Brugnoli e o 2° vice-presidente da Associação de Magistrados Catarinenses, desembargador aposentado Salim Schead dos Santos.
A palestra de abertura, ministrada pela juíza Cândida Inês Zoellner Brugnoli e mediada pela procuradora do Estado Flávia Dreher, abordou uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) na área da saúde: o Tema 1234. Decorrente de recurso extraordinário de autoria da procuradora, o Tema reconhece a necessidade de responsabilizar também a União pelas despesas da judicialização da saúde, especialmente no fornecimento de medicamentos. A juíza Cândida Brugnoli acompanhou o julgamento da ação, e participou da formulação do acórdão entre os entes federativos e a União. Em sua palestra, ela apresentou os principais pontos da decisão e seus impactos para a saúde pública.
O primeiro painel do Ciclo de Palestras, intitulado Fraude na Saúde: Casos Práticos e Impactos Sociais e Financeiros, foi mediado pela juíza Maira Salete Meneghetti, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). Discutindo irregularidades no setor que podem ocasionar em litigâncias, contou com uma palestra ministrada pelas advogadas da Unimed, Andreza Lupi e Alessandra Monti Badalotti. Na sequência, a procuradora do Estado Flávia Dreher falou sobre a Litigância predatória no setor de saúde e a sobrecarga do Judiciário, que segundo ela, é entendida “como o desvio ou manifesto excessivo do direito de acesso ao Poder Judiciário, comprometendo a capacidade de prestação jurisdicional e o acesso a esse direito por outras pessoas”.
“Esse fenômeno favorece o aumento da judicialização na área da saúde, e compromete o atendimento do Executivo e do Judiciário a outras demandas essenciais para o Estado, além de gerar gastos públicos consideráveis”, explica a procuradora. Flávia mencionou como exemplo de casos de litigância predatória as ações que envolvem o uso de canabidiol por pacientes com doenças crônicas. Esse tema foi aprofundado pelo médico Ylmar Corrêa Neto, que ministrou a palestra Canabidiol: Medicina baseada em evidências e a banalização do uso.
No período da tarde, o segundo painel do Ciclo de Palestras, intitulado Transtorno do Espectro Autista (TEA) em Foco, teve início com a exposição ministrada pelo médico Adilson Luiz Bernardino, que abordou as principais inovações no diagnóstico e no tratamento do TEA. Em seguida, o doutor em neurociências Hiago Melo apresentou a palestra Medicina baseada em evidências: terapia para o espectro autista, que tratou sobre alternativas de abordagem terapêutica e tratamentos eficazes para indivíduos no espectro, especialmente na área da Análise do Comportamento Aplicado (ABA na sigla em inglês).
“O diagnóstico deve ser feito ao longo de várias sessões, e precisa envolver também um plano de cuidado para esse paciente compatível com suas necessidades individuais”, explicou ele. “A terapia de TEA não é igual para todo mundo, varia de acordo com os marcos de desenvolvimento de cada um, do contexto social, e de vários outros fatores”.
Após Hiago, o enfermeiro Tiago Lucero seguiu com as palestras do painel ao falar sobre o papel da família no tratamento de pacientes no espectro, e as inovações tecnológicas que podem ser aplicadas nesse processo. A última palestra do painel, por sua vez, abordou o outro lado desse processo. A assistente social e executiva da área da saúde, Iza Daiana Wiggers, falou aos presentes sobre os desafios enfrentados pelas clínicas voltadas ao atendimento do TEA.
Com mediação da juíza Cândida Brugnoli, o último painel do Ciclo de Palestras, intitulado Novos Modelos de Desjudicialização na Esfera da Saúde, abordou estratégias inovadoras para redução de litigâncias na área. A primeira exposição foi realizada pela servidora da PGE/SC Juliana Ribeiro Goulart, que atua junto ao escritório da instituição no TJSC. Ela sobre as iniciativas de desjudicialização desenvolvidas pela Procuradoria, em especial a Câmara Administrativa de Solução de Conflitos, da qual ela fez parte.
“A judicialização tem um custo financeiro e social muito grande, que acaba impactando em outras áreas da Administração Pública. Isso acaba dificultando a implementação de políticas públicas que garantam o acesso dos cidadãos aos seus direitos fundamentais”, explicou a servidora, ao falar sobre a importância de iniciativas nesse sentido. “Não é possível resolver esse problemas pontualmente, é pensar em abordagens sistêmicas e estruturais, em ferramentas que busquem reduzir as litigâncias por outros meios, como a conciliação”.
O juiz de Direito André Alexandre Happke abordou em sua palestra o papel de outra instituição que busca a redução de litigâncias: o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc). Em seguida, o médico Leandro Figueira, diretor do Cuidado Integrado do Hospital Albert Einstein falou sobre as iniciativas de atenção primária à saúde na unidade paulistana, que busca não apenas atender aos pacientes, mas aumentar a eficiência operacional da organização, garantindo economia de recursos e uma maior qualidade de atendimento.
A última palestra do painel foi ministrada pela assessora jurídica do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça e Proteção à Saúde Pública do Ministério Público do Estado do Paraná (MP-PR). Sob o título Obstinação terapêutica e seus desafios no sistema de saúde, tratou sobre os cuidados a pacientes terminais – tanto o direito desses indivíduos ao atendimento de qualidade e sua liberdade de escolha quanto ao prolongamento de seu tratamento. Segundo ela, o avanço da tecnologia teve impacto significativo na relação das pessoas com a morte, que deve ser discutido pelos operadores judiciais da área da saúde.
Intitulada Judicialização da saúde suplementar: reflexões e desafios na visão do Poder Judiciário, a palestra de encerramento do evento ficou sob responsabilidade do desembargador Edir Josias Silveira Beck. O magistrado falou sobre os impactos do grande volume de litigâncias no funcionamento da Justiça catarinense, e a necessidade de soluções para esse problema.
(Colaboração: Mateus Spiess).