Para você, que nesse momento está lendo um jornal, deve ser até difícil conceber o fato de que hoje, no Brasil, quase um quarto da população entre 15 e 29 anos não estuda nem trabalha. São 11 milhões de brasileiros, no auge da vida produtiva, sem perspectiva. Esse número é resultado de uma recente pesquisa feita pelo Banco Mundial. Além do número global, os pesquisadores trabalharam com uma amostra qualitativa, ouvindo em profundidade dezenas de jovens de 18 a 25 anos, moradores tanto de zonas urbanas quanto das rurais.
A percepção é de que, além de não ter estudo nem trabalho, situação conhecida pelo termo “nem-nem”, eles também são vitimados pelo nosso preconceito. Esse enorme grupo é extremamente heterogêneo e enfrenta muitas barreiras à construção da sua motivação própria. Em geral, as condições relacionadas à pobreza e ao gênero pesam mais e são mais difíceis de superar. Muitos desses jovens vêm de gerações de analfabetos e de subempregados. Não tiveram contato com profissionais bem-sucedidos, não identificaram exemplos na família e não foram motivados pela escola. Muitos nem sonham em sair da sua condição de inércia, simplesmente por não enxergarem em si algum potencial. As moças, em grande parte, não concebem um futuro além de criar os filhos – e o que é pior – nas mesmas condições e reproduzindo as mesmas normas sociais que restringem o papel da mulher na sociedade.
O estudo identificou ainda uma outra situação: a dos jovens que chegaram a estudar ou trabalhar, mas desistiram por conta das dificuldades, como conciliar trabalho e estudos, falta de dinheiro para se locomover ou adquirir materiais, entre outros requisitos básicos. No caso das jovens mães, a desistência aparece ligada às dificuldades de conciliar atividades e à discriminação que sofreram por parte de potenciais empregadores.
Tendo ou não estudado ou trabalhado, esses milhões de jovens hoje estão sem perspectiva, não imaginam o futuro. Isso, além de muito triste, é preocupante. A força de trabalho no Brasil está envelhecendo e em menos de 20 anos começará a diminuir. Esse desperdício de força produtiva hoje terá reflexos na produtividade e no crescimento econômico amanhã.
A conclusão dos pesquisadores é que, mais que oferecer oportunidades por meio de cursos técnicos, é preciso promover aspirações que os motivem ao estudo e ao trabalho. Facilitar o acesso a informações sobre oportunidades e como elas podem de fato transformar vidas, especialmente no meio rural, é uma medida imediata a ser tomadas. Oferecer a esses jovens o sentimento de pertencimento é outra ferramenta para sensibilizá-los de que eles também podem ter acesso a essas oportunidades. A recomendação para programas de mentoria, nos quais os jovens teriam acesso a apoio e exemplos concretos também aparece no estudo.
O fato é que não temos hoje governos focados em ajudar quem mais precisa, nem em prioridades políticas, nem de investimentos. Salvo exceções, quem está “nem-nem”, em geral, é o poder público. Se não houver mudança de prioridades, essa massa da nossa população seguirá invisível e esmagada por estigmas. Um país que vira as costas para seus jovens está ameaçando seu próprio futuro.
Antonio Gavazzoni, advogado e doutor em Direito Público
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