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“O sucesso da agricultura e pecuária de SC é fruto de muita dedicação”

Afirmação é do diretor de agronegócio da Associação Comercial e Industrial de Chapecó (ACIC), Fernando Prezzotto

O Brasil construiu um setor agropecuário forte, sustentável e competitivo, com investimentos em pesquisa agropecuária, tecnologia e inovação. Neste momento em que a crise econômica provocada pelo novo coronavírus atinge todos os setores da economia nacional, o agro se mantém como suporte de produção, geração de divisas e garantia de emprego. Em Santa Catarina, o setor produtivo é muito qualificado e organizado, com um status sanitário diferenciado que garante alimentos de qualidade. Nesta entrevista, o diretor de agronegócio da Associação Comercial e Industrial de Chapecó (ACIC), Fernando Prezzotto, explana sobre o agro.

O agronegócio continua sendo a locomotiva do desenvolvimento econômico de Chapecó, contudo, a matriz econômica está se diversificando. Em razão do crescimento de outros setores – como o de tecnologia, moveleiro, metalmecânico etc. Até quando a liderança do agro se manterá?

O agro é a locomotiva não só de Chapecó, mas do Brasil todo. É muito saudável para a região/país que a matriz econômica se diversifique e cresça em vários setores. Como um bom exemplo neste sentido vejo o dos Estados Unidos, onde o agro é tão forte quanto o nosso. Porém, quando avaliamos a relevância no PIB americano podemos claramente observar que é bem mais diversificado, com muitos setores pujantes que ajudam a nação a se desenvolver. Desejamos que o agro continue forte, tanto quanto seria incrível ver outros segmentos como tecnologia, indústria, comércio, serviços etc. ganhando cada dia mais importância. Muito se fala que o Brasil tem vocação para o agro e por isso seremos líderes mundiais. Temos realmente vocação, mas ao longo de décadas inúmeros desafios tecnológicos específicos do cultivo em regiões tropicais e subtropicais foram superados para que esse potencial fosse, de fato, aproveitado. Podemos dizer que éramos um diamante bruto que foi lapidado com o desenvolvimento de tecnologias específicas para a agricultura tropical. Não podemos esquecer da enorme contribuição que a Embrapa teve para o Brasil na superação desses desafios até então intransponíveis. Com isso, quero aproveitar a oportunidade para provocar outros segmentos também a pensar que podemos ser importantes players em qualquer mercado. O brasileiro é criativo, alegre, empreendedor. Temos o diamante bruto para vencer em qualquer setor.

Em 2019 e 2020 o mercado externo – em grande parte graças ao “fator China” – permitiu um resultado extraordinário ao agronegócio brasileiro, catarinense e chapecoense. Até quando esse quadro altamente positivo se manterá?

Talvez seja mais fácil prever os números da Mega-Sena do que acertar isso com precisão. De fato, estamos sendo beneficiados por fatores externos, como a briga entre China e EUA que passaram de bandeja uma demanda incrível por todos nossos produtos do agro, além de termos simultaneamente uma importante alta do dólar, levando os produtos agrícolas a preços recordes em reais. As recomendações de analistas de mercado é aproveitar essa combinação vitoriosa para o produtor brasileiro e travar/vender parte das próximas safras. Hoje já existe possibilidade de vender a safra 2022 de soja e milho a preços que até pouco tempo atrás não existiam nem em sonho. Os mercados de commodities oscilam devido a inúmeros e incontroláveis fatores. Portanto, aproveitar a oportunidade neste momento pode levar o produtor de grãos a garantir mais, no mínimo, dois anos excelentes. Ver além disso, depois da montanha, é um exercício de adivinhação e cenários que podem ou não se realizar. Uma coisa é clara: a demanda por alimentos e energia é muito forte e consistente, conforme previsões da ONU até pelo menos 2050. Mas com certeza não vamos navegar só em céu de brigadeiro por 30 anos, por inúmeros motivos, altas e baixas acontecem. Porém, o norte verdadeiro para o agro se mantém com demanda crescente no longo prazo.

O setor primário é um dos que mais utiliza a ciência e a tecnologia. Como o senhor avalia o nível de desenvolvimento tecnológico da agricultura de Chapecó e de SC?

Nós somos referência no mundo todo em agricultura tropical, somos base de tecnologia para o desenvolvimento em novas regiões agrícolas como a África. A agricultura e a pecuária que temos são fruto do forte investimento em pesquisa, tanto pública quanto privada, e do uso da tecnologia gerada.

O desempenho dos demais setores da economia – como a indústria, o comércio, a prestação de serviços – ainda depende muito do sucesso da agricultura? Ainda vale aquele bordão “se a agricultura vai bem, tudo vai bem”?

O agro é uma locomotiva tão potente que arrasta consigo muitos outros setores, levando distribuição de riqueza a toda a cadeia impactada, que é gigante. São inúmeros setores beneficiados, desde a construção civil, indústria de equipamentos, aditivos, nutrientes, embalagens, logística, etc. Quando pensamos sobre os milhões de empregos gerados e por onde todo este dinheiro circula, é difícil até de dimensionar o tamanho do impacto. Esse ditado talvez nunca esteve tão atual!

As pesquisam indicam que a crise não atingiu os municípios onde o agronegócio é robusto – especialmente onde funcionam indústrias de processamento de carnes. O senhor concorda com essa avaliação?

Na verdade, o interior do Brasil que é muito ligado a agricultura e pecuária passou muito bem por esta crise. Nessas regiões o impacto foi muito menor, pois em plena crise do coronavírus o agro seguiu ampliando a oferta de empregos, produzindo e exportando mais. Como ficou recentemente popularizado, “o agro não para!”.

No passado os ambientalistas acusavam a agricultura empresarial brasileira de ser a vilã do meio ambiente em razão do uso excessivo e predatório dos recursos naturais. Essa discussão está superada?

O produtor brasileiro deveria, na verdade, ser premiado e pago pelo resto do mundo pela preservação que é feita. Em Santa Catarina, as propriedades rurais ocupam 67,3% do território do Estado, são 6,4 milhões de hectares destinados à produção agropecuária. Dessa área, 40,4% estão cobertas de florestas nativas ou plantadas (2,6 milhões de hectares); 28,4% são utilizadas para pastagem (1,8 milhões de hectares) e 22,9% para lavouras (1,5 milhão de hectares). Em muitas regiões do Brasil o agricultor compra uma fazenda e só pode usar 20% dela para sua atividade e 80% precisa preservar. É como você comprar um apartamento e ter, na prática, direito só de usar a garagem. Penso que nossa legislação ambiental é um exemplo para boa parte do mundo. É muito fácil jogar pedras, mas poucos países se olham no espelho antes de jogar pedra no Brasil. A pergunta que fica é: quem vai remunerar o agricultor que é obrigado por lei a manter até 80% de sua propriedade como reserva ambiental? O mundo quer o Brasil como pulmão? Então temos que combinar o valor do ar puro. Como exemplo, o estado do Pará tem um potencial agrícola muito superior ao principal estado agrícola brasileiro da atualidade que é o Mato Grosso. Porém, o proprietário de terras lá tem que preservar 80% e não recebe nada por isso.

Chapecó tem, atualmente, dezenas de instituições de ensino superior em funcionamento. Em sua opinião, não deveria haver um maior número de projetos – em convênio com o setor produtivo – para ações e pesquisa na área da agricultura e pecuária?

Recentemente tivemos no Brasil o Marco da Inovação. Isso viabiliza a parceria entre universidades públicas, empresas de pesquisa estatais, ICTs etc. Acredito que existe um potencial incrível a ser explorado por todos os setores em iniciativas de open inovattion, as quais podem trazer muitas divisas para o Brasil. Nossa região tem diversos centros de pesquisa em universidades, instituições de pesquisa públicas etc. Está na hora de juntarmos a fome com a vontade de comer e transformar as tecnologias criadas em inovações e soluções práticas produzidas e vendidas pelas empresas brasileiras no mundo todo. Não precisamos exportar só commodities, quem sabe logo estaremos exportando tecnologia e recebendo royalties.

As cadeias produtivas da avicultura e da suinocultura industrial catarinense – consideradas as mais avançadas do mundo – chegaram ao seu limite no grande oeste barriga-verde?

Nossa região tem um insumo raro que é formado por milhares de famílias de pequenos agricultores que se dedicam de coração a fazer tudo da melhor maneira possível. Isso não é facilmente replicável, depende de cultura, da criação, da importância que se dá ao trabalho bem feito, da atenção aos detalhes. Tive a oportunidade de algumas vezes visitar pequenos agricultores e eles são os verdadeiros heróis. Esse pessoal trabalha duro, muitas vezes de domingo a domingo. O sucesso da agricultura e pecuária catarinense não veio por acaso, é fruto de muita dedicação e mérito. Neste cenário, o sistema cooperativista tem uma importância incrível, unindo os pequenos produtores e fazendo ser possível a economia de escala, comprando bem seus insumos, prestando assistência técnica, industrializando e agregando valor aos produtos do campo. Portanto, acredito que nem nós mesmo sabemos qual é o nosso limite. Toda essa cadeia produtiva continuará fazendo muito bem feito o que sempre fez, que é acordar cedo, batalhar de sol a sol, sonhar e realizar. Para toda esta boa vontade, o céu é o limite!!

Foto – Fernando Prezzotto, diretor de agronegócio da ACIC / divulgação