Terá prosseguimento o pedido de processo de impeachment movido contra o governador Carlos Moisés da Silva, que diz respeito à compra dos 200 respiradores pulmonares por R$ 33 milhões pelo governo do Estado, entre outros fatos apurados. A decisão pela admissibilidade da denúncia foi definida na sessão do Tribunal Especial de Julgamento iniciada na manhã desta sexta-feira (26/3), por meio de videoconferência, sob a coordenação do presidente do Poder Judiciário de Santa Catarina (PJSC), desembargador Ricardo Roesler. O ato foi encerrado pouco antes da meia-noite.
Por maioria de votos, prevaleceu o entendimento de que o chefe do Executivo tinha conhecimento prévio da compra dos equipamentos sem a observância das prescrições legais. A relatora sorteada, desembargadora Rosane Portela Wolff, manifestou que houve, no mínimo, omissão juridicamente relevante do governador. Também manifestaram-se pelo prosseguimento do processo, seguindo a posição da relatora, a desembargadora Sônia Maria Schmidt e os desembargadores Roberto Lucas Pacheco, Luiz Zanelato e Luiz Antônio Fornerolli, além do deputado Laércio Schuster. Com o entendimento de que não houve crime de responsabilidade por parte do governador, votaram pela não admissibilidade da denúncia e pelo seu arquivamento os deputados Marcos Vieira, José Milton Scheffer, Valdir Cobalchini e Fabiano da Luz.
Com o placar de 6 a 4 definido pelo prosseguimento do rito, não houve necessidade de voto por parte do presidente Ricardo Roesler, que se manifestaria apenas caso fosse necessário o desempate. Assim, o governador Carlos Moisés da Silva passa a condição de denunciado e ficará suspenso do exercício das funções a partir da próxima terça-feira (30/3) até sentença final, além de perder 1/3 dos vencimentos, pelo prazo de 120 dias. A vice-governadora Daniela Reinehr (sem partido) assumirá interinamente o comando do Estado. O acatamento da denúncia implicará, também, no julgamento de Moisés por crime de responsabilidade, que poderá levá-lo à perda definitiva do cargo, em caso de condenação.
Ao fim da sessão, Roesler agradeceu à equipe técnica, assessores, servidores e demais profissionais envolvidos na realização do ato. Também cumprimentou os procuradores das partes, a imprensa e demais julgadores. “Senhores julgadores, o momento reclama comprometimento. É a obrigação de todos com a sociedade catarinense. Rogo a todos do Executivo, do Legislativo e do Judiciário que mantenham esse espírito elevado. Não proponho um apelo retórico. É preciso, sim, resgatar esse espírito de pertencimento do povo catarinense. É preciso que todo cidadão tenha orgulho de ser catarinense, de criar sua família e trabalhar nesse maravilhoso Estado. Pouco importa onde quer que tomemos assento, servimos todos aos mesmos desígnios e devemos partilhar o mesmo propósito. Acredito no diálogo baseado em princípios virtuosos. Acredito em um Estado exponencial, independente, plural, democrático e protagonista da transformação social que vivemos no mundo. Creio que é isto que todos desejam, precisam e merecem. Que assim Deus nos ajude”, declarou.
Independência entre esferas penal e política
Em seu voto, a desembargadora relatora Rosane Portela Wolff destacou que há independência entre as esferas penal e política. O apontamento pelo Ministério Público Estadual de que o governador não tem participação ativa ou passiva na negociação ou aquisição direta dos ventiladores pulmonares, observou Rosane, não impacta na eventual prática de crime de responsabilidade.
Da mesma forma, a desembargadora anotou que a alegada conclusão da Polícia Federal de que o governador não teria praticado ilícito penal não foi compartilhada no âmbito do Tribunal Especial de Julgamento. Sem acesso ao documento oficial elaborado pela PF, sustentou a relatora, permite-se concluir pelo desconhecimento de seu conteúdo. “Importante destacar que a eventual conclusão de que o excelentíssimo governador Carlos Moisés da Silva não tem qualquer participação ativa ou passiva na negociação ou na aquisição direta dos ventiladores pulmonares não impacta na eventual prática de crime de responsabilidade. A responsabilização política está focada no fato de que o representado tenha tido ciência de que o contrato de aquisição dos ventiladores pulmonares previa a hipótese de pagamento antecipado, sem a prestação de qualquer garantia ao Estado. Isso, por si só, sem a tomada de qualquer providência a fim de obstar o prejuízo ao erário, já é fato suficiente à responsabilização política, pouco importando para este fim se o contrato administrativo foi firmado por conta de conluio e fraude de terceiros”, manifestou.
Momento emblemático na história da política e do Judiciário de SC
Na abertura dos trabalhos, ainda na manhã de sexta-feira, o presidente Ricardo Roesler classificou a solenidade como mais um momento emblemático e sem precedentes na história da política e do Judiciário catarinense. “Temos sob os nossos ombros e cabeças uma responsabilidade que transcende nossos interesses e anseios pessoais. Uma responsabilidade, por óbvio, incompatível com o exercício de conveniências. É muito evidente que a adversidade de ideias é ínsita à pluralidade. As divergências são bem-vindas enquanto estimulam a reflexão, enriquecem o debate e nos levam ao aperfeiçoamento das ações. Mas é preciso agir, como sempre, com sabedoria e serenidade. Que tudo neste augusto tribunal seja tratado sob os influxos dos sãos princípios da moral, da razão, da ética, da lei, do respeito e da justiça”, anunciou Roesler. A sequência da sessão contou com as manifestações dos advogados Bruno de Oliveira Carreirão (acusação), Dulcianne Beckhauser Borchardt (acusação), Leonardo Borchardt (acusação) e Marcos Fey Probst (defesa).
Negado pedido de suspeição de deputado integrante do julgamento
Também no início da sessão desta sexta-feira, o presidente Ricardo Roesler comunicou o não conhecimento do pedido protocolado pelo deputado Ivan Naatz, que postulava pela suspeição do deputado José Milton Scheffer enquanto integrante do tribunal especial. Naatz justificou que Scheffer é o atual líder do governo na Assembleia e, portanto, com voto parcial em função de atuar na defesa do governo.
Roesler, no entanto, destacou que as causas de impedimento e suspeição que visam a garantia de imparcialidade nas causas perante o Poder Judiciário não se compatibilizam com o processo jurídico-político do impeachment. O presidente também observou que aguardou-se as vésperas da sessão para que fosse postulada a suspeição, com base em fatos conhecidos desde janeiro. A nulidade, pontuou Roesler, deveria ser arguida na primeira oportunidade após o conhecimento dos fatos. “A petição, além de inconveniente, é extemporânea. Razão pela qual não conheço do pedido, pela ilegitimidade do requerente”, anunciou Roesler.