A Constituição de 1988, desde sua redação originária, previu a possibilidade de instituição da chamada aposentadoria especial para servidores públicos que desempenhassem atividades perigosas, insalubres ou penosas. Todavia, sua efetivação dependeria de Lei.
Assim, depois de diversas discussões, se a Lei Complementar (LC) 51/85 teria ou não sido recepcionada pela Constituição, a União sancionou a LC nº 144/2014, que reforçou a aposentadoria dos policiais, objetivando, a princípio, afastar a controvérsia existente sobre o tema.
Dessa forma, com a nova LC nº 51/85, definiu-se que: “O servidor público policial será aposentado: … II – voluntariamente, com proventos integrais, independentemente da idade: a) após 30 anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, 20 anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se homem; b) após 25 anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, 15 anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se mulher.”
Com isso, verificou-se que a grande inovação trazida pela nova redação consistiu no estabelecimento de requisitos diferenciados para a concessão do benefício a homens e mulheres, até então não previsto na legislação federal, mas já previsto em Santa Catarina, conforme o contigo na LC º 335/2006.
Com o advento da EC n.º 20/98, a possibilidade de aposentadoria especial passou a fundamentar-se na exposição da saúde e da integridade física do segurado a riscos que na visão do legislador, a partir de então, é a mesma para ambos, sendo que a Lei manteve, ainda, a exigência de tempo mínimo no exercício de atividade policial, consistente para o homem em 20 anos de serviço e 15 anos para as mulheres.
Mas por que o policial tem direito a aposentadoria com 30 anos de contribuição para homens e 25 para mulheres, se no serviço público o direito à aposentadoria para os homens dá-se com no mínimo 35 anos de contribuição e para mulheres com 30? Porque a profissão de policial, além de perigosa, expõe a saúde do servidor, considerando que um policial realiza desde ações policiais complexas, com troca de tiros, até plantões noturnos (quando dormir e, via de regra, adquiri insônia).
Para a médica Priscila von Oberst: “Uma noite sem dormir deixa o indivíduo sem energia, irritado, com dificuldade de concentração, com queda no desempenho, podendo levar até a um acidente de trabalho e morte. Em longo prazo, os danos também são graves e podem levar a doença cardiovascular, obesidade, diabetes, problemas de memória, mau funcionamento do sistema imunológico e até câncer. Alguns estudos estão demonstrando que a falta da produção da melatonina – o hormônio responsável por manter nosso ciclo sono-vigília e que é produzido apenas à noite, quando estamos dormindo – parece estar associado a um número maior de cânceres.”
Provavelmente é por isso que cerca de 63 policiais civis morreram durante o serviço ativo nos últimos cinco anos, fora aqueles que adquiriram doenças graves em razão da função e acabaram perdendo a vida depois de aposentados. Esse é o motivo pelo qual a aposentaria especial não é um prêmio depois de 25 ou 30 anos de contribuição, mas um mecanismo para evitar a morte precoce ou a aquisição de uma moléstia grave.
Ulisses Gabriel – Delegado de Polícia Civil. Presidente da ADEPOL/SC (Associação dos Delegados de Polícia de Santa Catarina)