O Mercado Público de Florianópolis é a vida, a alma da Ilha. Sempre foi assim desde a construção da primeira Praça do Mercado em 1851 e, depois, do atual edifício inaugurado a 5 de fevereiro de 1899 e ampliado em 1931. Daí passou a ser o nosso endereço oficial, o lugar de todos, democrático, onde a cidade se encontra e se identifica. Por tudo que significa, o Mercado é um dos ícones da Ilha de Santa Catarina e patrimônio cultural da nossa gente. Espelha a multiculturalidade e os sentimentos de pertença dos moradores que, de forma consciente ou não, carregam no seu jeito de ser, de estar, de bem viver e que nesta tessitura de renda fina configura a identidade cultural da cidade – a cara de Florianópolis humorada e irreverente.
Sábado, perto do meio dia, dei uma circulada pelo Mercado Público ainda impregnado pelo clima festivo que envolve a cidade, seu povo e a Ilha com a sua reabertura no último dia 5 de agosto. Tudo transbordando como uma maré cheia de afetos e merecidos aplausos. Bonito e borbulhante. Espiei de um lado a outro. Encontrei amigos e vi muita cara nova. Apreciei as novas peixarias em grande azáfama. O cheiro de ontem estava ali. O de hoje começa a fluir… Sem mais nem menos, do passado assomaram imagens caleidoscópicas da memória, em movimentos coreografados, um balaio de recordações e de saudade levados pelo carrossel imparável do tempo.
Neste caminhar emocionado pelo Mercado reformado me veio a lembrança do incêndio que, há dez anos, no dia 19 de Agosto de 2005, numa ensolarada manhã, rompeu na Ala Norte do centenário edifício. O fogo devorou tudo, devastando e transformando, rapidamente, em cinzas o sustento de muitas vidas. Um fumo negro manchou o céu azul da Ilha, deixou o manezinho arrepiado, abismado, sem entender o que acontecia na sua Florianópolis em plena manhã de sexta-feira. Silencioso, chorava. Nem secava as lágrimas que teimavam lavar a sua face. Quem sabe na esperança de apagar o lume que queimava o seu coração. Enquanto ardia em chamas o velho e querido Mercado, histórias eram contadas e recontadas. O tempo tratou de apagar o rastro amargo, o sabor de lágrima, o sentimento de perda, a alma enlutada. Do dia trágico, ficaram as lembranças.
Hoje é um novo amanhã e o templo do povo continua ali, elegante, sem vergar, indissociável e muito amado. Eis, nosso Mercado do século XXI. Um Balaio de povo, de vida, de histórias, de memórias da nossa gente.
Lélia Pereira Nunes, escritora da ACL