Última residência do emblemático político catarinense estava prestes a desabar há cinco anos
O público que prestigiar a Casa Cor Florianópolis deste ano vai poder conferir em primeira mão o resultado de mais de três anos de dedicação ao restauro da última residência que abrigou o ex-governador Hercílio Luz. Situada na avenida Mauro Ramos, no antigo caminho para a Chácara de Espanha, e a meros 500 metros da Avenida Beira Mar Norte, o palacete em estilo eclético construído no século XIX estava prestes a desabar antes de ter sido adquirido pela Incorporadora Milano, que se encarregou do seu completo restauro.
Quase 20 anos de abandono abalaram completamente a estrutura da edificação, que havia sido tombada como Patrimônio Histórico pela Fundação Catarinense de Cultura (FCC) em 2002. Árvores cresciam dentro da casa, cupins comprometeram o madeiramento da estrutura e de portas e janelas, o reboco das paredes se soltava com a vibração dos passos dentro dela. Os anos em que ficou sem utilização, a residência serviu para abrigar moradores em situação de rua, que contribuíram ainda mais para sua degradação.
Para resgatar a imponência desta importante edificação, a Milano Incorporadora contou com projeto assinado pela arquiteta Lílian Mendonça, e executado pelo engenheiro Ângelo Buratto, que foi aprovado pelos órgãos públicos e supervisionado pela Fundação Catarinense de Cultura (FCC). A sua completa reestruturação envolveu 30 profissionais qualificados e dedicados a promover o resgate dos ricos detalhes que adornam o palacete, marcante pelos elementos art nouveau e art déco.
Escavações promovidas no subsolo com objetivo de conferir o seu reforço estrutural revelaram a presença de dois períodos construtivos diferentes que a edificação foi submetida. No primeiro deles, arcos romanos em tijolos foram adotados como base de sustentação. E posteriormente, a escolha por pedras argamassadas e paredes com mais de 80 centímetros de espessura fizeram as bases necessárias para se edificar um segundo pavimento, feito pelas mãos do próprio Hercílio Luz, que era engenheiro, após recebê-la em doação em 1895.
Tour pelo palacete
Ao primeiro contato, uma escadaria monumental em mármore de carrara direciona para a entrada principal da casa, com seu pé direito de 4,5 metros, portas de 3 metros e seus 825 metros quadrados de área construída. Uma varanda em belvedere se projeta sobre o jardim e é adornada com ladrilhos hidráulicos semelhantes aos observados na calçada do Palácio Cruz e Sousa, antiga sede do governo e que foi reformada na época em que Hercílio Luz era governador.
Algumas influências artísticas foram estabelecidas entre a casa Hercílio Luz e o Palácio Cruz e Sousa. No interior da casa, em seu primeiro pavimento formado por sete salões, foram descobertas pinturas murais em tons de verde e vermelho, similares aos da antiga sede do Governo Catarinense. “Fizemos testes e constatamos que o vermelho é exatamente o mesmo tom da sala de jantar do Palácio Cruz e Sousa; enquanto o verde é o mesmo da área íntima do palácio. O que demonstra como Hercílio Luz buscou inspirações na sede do governo ao dar vida e cor à sua residência particular”, explica a restauradora e responsável pela recuperação das pinturas murais da Fundação Catarinense de Cultura, Márcia Escorteganha.
A laje feita em gesso estuque também é uma raridade e denota a herança colonial da edificação. Valiosa descoberta artística foi feita durante a execução do projeto de restauro. Um afresco à secco encontrado no subsolo intrigou até membros da Fundação Catarinense de Cultura, como a restauradora Márcia Escorteganha, que empenhou-se pessoalmente em seu resgate. “Essa técnica de pintura comum na Itália é raríssima aqui no Brasil. Em Florianópolis, temos poucos registros dessa técnica, como no Palácio Cruz e Sousa, na Catedral Metropolitana e na sede da Aliança Francesa. No entanto, esse afresco da casa Hercílio Luz é ainda mais elaborado ao ser composto por cores diferentes”, declara Márcia.
Interferência direta de Hercílio Luz
Político proeminente de Santa Catarina, Hercílio Luz também era engenheiro de formação. Ao receber a casa em doação em 1895, ela contava apenas com um pavimento. Hercílio foi responsável por edificar um segundo pavimento, contendo dois ambientes e um terraço, que lhe permitia observar à distância a construção da ponte que nem mesmo ele veria concluída e batizada com seu nome.
O trabalho de adaptação de um elevador na casa revelou a presença de manilhas hidráulicas ligando o primeiro piso ao térreo, o que leva a crer que Hercílio também inovou ao trazer um banheiro privativo para dentro da casa. Para os padrões da época, no início do século XX é algo raro de ser visto, pois banheiros eram situados na área externa das residências.
“Observar uma importante obra sendo restaurada, tendo preservado seu passado arquitetônico, suas influências construtivas e de estilo, e ter recuperada toda a sua imponência é o sonho de todo restaurador, e de todas as pessoas que valorizam a história do seu povo. E essa conquista na casa Hercílio Luz está sendo possível graças à atuação desta importante parceria firmada com a iniciativa privada”, enaltece Márcia.
A Casa Hercílio Luz
Hoje, completamente restaurada, a casa do governador Hercílio Luz abre as portas para sua apreciação em primeira mão aos visitantes da Casa Cor Florianópolis. A arquiteta Eduarda Tonietto assina o projeto que vai promover o resgate da história da edificação, em paralelo ao contato com a história deste proeminente político.
Em um segundo momento, a casa estará disponível para visitação gratuita mediante agendamento prévio e servirá para abrigar eventos diversos, ao integrar um complexo com essa finalidade dentro do empreendimento Cidade Milano.