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STF acolhe pedido da PGE/SC e impede alteração tributária que provocaria prejuízos milionários aos Estados

Tema 633 trata da compensação de créditos de ICMS decorrentes da aquisição de bens destinados ao uso e consumo do estabelecimento no ciclo de produção da mercadoria exportada

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu atender a um pedido feito pela Procuradoria-Geral do Estado de Santa Catarina (PGE/SC) a fim de evitar a perda de centenas de milhões de reais da arrecadação Estadual. O assunto teve repercussão geral reconhecida, ou seja, mesmo que a decisão tenha sido tomada no âmbito de um recurso apresentado por SC, valerá para todas as unidades da federação.

O processo começou a tramitar em 2008 e, no caso concreto, trata da interpretação dada por uma empresa do ramo madeireiro do Meio-Oeste catarinense que pediu o direito de escriturar, manter e aproveitar os créditos de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias, Bens e Serviços (ICMS) de bens adquiridos e destinados ao uso e consumo do estabelecimento dentro do ciclo de produção de mercadorias destinadas à exportação. A companhia queria aproveitar imediatamente os créditos decorrentes da compra dos insumos, pois entendia que isso estaria assegurado pela Emenda Constitucional nº 42/2003.

Ao longo do processo, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) chegou a decidir a favor da empresa. No entanto, os procuradores do Estado, cientes de que a manutenção da decisão poderia causar prejuízos de cerca de R$ 230 milhões por ano à arrecadação estadual, segundo dados da Secretaria de Estado da Fazenda (SEF), interpuseram Recurso Extraordinário (RE) na Suprema Corte.

O pedido ganhou repercussão geral, já que outras unidades da federação também sofreriam com o impacto financeiro – o caso chegou a ser discutido em reuniões do Colégio Nacional dos Procuradores-Gerais dos Estados e do Distrito Federal (Conpeg), que reúne os chefes dos órgãos centrais de serviços jurídicos dos Estados e também atua juridicamente em defesa dos interesses dos seus cidadãos. A PGE/SC alegou, entre outros argumentos, que o acórdão violou o preceito constitucional (artigo 155, parágrafo 2º, inciso X, alínea “a” e inciso XII, alínea “c”).

A tese defendida foi a de que a Constituição prevê a imunidade do ICMS somente nas operações nas quais as mercadorias são destinadas para fora do país e nos serviços prestados a destinatários no exterior e que a compensação de créditos relativa ao imposto cobrado nas operações e prestações anteriores, conforme ressalva do art. 155, §2º, inciso X, alínea “a” da CF, relaciona-se ao crédito físico. “A aplicação do princípio da não-cumulatividade tem como premissa que o bem adquirido seja incorporado fisicamente à mercadoria e que, posteriormente, haja saída do estabelecimento com nova incidência do tributo. Assim, bens adquiridos para o ativo fixo ou para serem consumidos no processo de produção não se incorporam fisicamente à ela e têm a empresa ou indústria adquirente como consumidora final, não havendo, portanto, plausibilidade na aplicação da compensação”.

Segundo os procuradores que atuaram no caso, “a Emenda Constitucional (EC) 42/2003 apenas afastou a regra constitucional que exigia o estorno do crédito quando a operação não fosse tributada, ou seja, ela apenas constitucionalizou faculdade que até então era delegada a Lei Complementar no sentido de permitir a manutenção dos créditos, apesar das saídas não serem tributadas, para o fim de evitar alteração dessa sistemática pelo legislador infraconstitucional”.

Virada histórica

O julgamento do caso ocorreu no plenário virtual do STF e foi concluído no final da noite do dia 7 de novembro. Os primeiros quatro votos foram contrários ao entendimento catarinense, mas após a divergência do ministro Gilmar Mendes, os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Kassio Nunes Marques formaram maioria a favor de SC.

De acordo com o ministro Gilmar Mendes, a EC 42/2003 afastou por completo a incidência do ICMS sobre exportações, mas não substituiu o modelo de crédito físico pelo de crédito financeiro, segundo o qual todo e qualquer bem ou insumo usado na elaboração da mercadoria gera direito a crédito, mesmo se for consumido durante o processo produtivo.

“Nada indica que houve intenção de romper com a consagrada fórmula constitucional referente à apropriação de créditos em cadeias não cumulativas”, disse Mendes, explicando que a compensação do imposto exige a sua incidência na etapa anterior e na etapa seguinte. “Se o bem é consumido no processo de produção da mercadoria, não haverá cumulatividade de incidências”.

Para o procurador-geral do Estado, Márcio Vicari, trata-se de um resultado “extremamente relevante não só para os cofres públicos de Santa Catarina, mas de todos os Estados do Brasil”. A eventual mudança na interpretação do artigo 155, parágrafo 2º, inciso X, alínea  “a” da Constituição, em especial quanto ao aproveitamento de créditos financeiros, poderia, segundo ele, alterar a sistemática de apuração do ICMS que vige ao menos desde 1996 – ano em que foi editada a Lei nº 87/1996, já que até então permitia-se exclusivamente o aproveitamento de créditos físicos.

– Esta pauta foi acompanhada com muita atenção por todos os Estados, afinal os prejuízos financeiros seriam enormes – além de SC, que segundo a SEF perderia mais de R$ 228 milhões por ano na arrecadação, dano semelhante seria sofrido pelo Rio Grande do Sul, cuja cifra é parecida: mais de R$ 220 milhões. Além disso, haveria risco de passivo judicial decorrente do ajuizamento de milhares de ações pelos contribuintes solicitando a devolução do imposto não compensado – disse o chefe da PGE/SC.

Veja aqui as entrevistas com os procuradores Ricardo Gama e Daniel Rodriguez Teodoro da Silva sobre o assunto:

Atuaram no processo as procuradoras do Estado Bárbara Lebarbenchon Moura Thomaselli Martins, Carla Debiasi, e o procurador do Estado Daniel Rodriguez Teodoro da Silva, que fez sustentação oral no STF e despacho de memoriais.

RE 704.815.

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