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Uma nova era na política

Independente de quem ganhou ou perdeu nessas eleições de 2018, o fato é que um novo cenário político emergiu das urnas,  derrubando velhas máximas que sempre foram determinantes para a vitória, revelando novos comportamentos do eleitor e apontando novas tendências. A capilaridade partidária, a presença de palanque nos estados e a distribuição de santinhos de papel, por exemplo, não provaram a eficácia de antes diante do “canhão” das redes sociais. Explico. A presença de lideranças locais, neste pleito, não exerceu a mesma influência, segundo especialistas em marketing político.

Com mais de 120 milhões de contas ativas no Brasil, o WhatsApp foi a forma mais eficaz para chegar ao interior, atingindo pessoas que pareciam alheias ao processo político tradicional.  Desta vez as sugestões de candidatos vieram por mensagens de familiares ou de conhecidos. Aliás, o “santinho virtual” parece ter feito  toda a diferença, principalmente no dia da eleição, quando pedir voto nas ruas é proibido.  Uma restrição que não impediu a proliferação  de materiais via redes sociais.

Marcada por temas morais, tais como corrupção, religião e valores familiares, o pleito de 2018 foi movido pelo sentimento de indignação.  A maioria dos eleitores mostrou-se indiferente diante das tradicionais propostas. Mesmo as ideias para enfrentar a crise econômica, problema grave vivido pelo País e estados, não chamaram tanto a atenção. Segundo recente pesquisa do Datafolha, pouco mais de 10% da população votou com base em propostas.

E, se a força da internet ainda não havia convencido o universo político, as eleições de 2018 provaram que sim, chegou a vez do digital, principalmente se o candidato fez o “dever de casa” e iniciou o “flerte” com o eleitor bem antes do pleito, captando leads, telefones e e-mails, gerando um “recall digital”,  patrimônio quase que exclusivo da TV.

Foi o caso do presidente eleito, Jair Bolsonaro. Se foi determinante ou não para a vitória, o fato é que o deputado construiu uma audiência digital anos antes (pelo menos quatro anos antes), viajando pelo Brasil com uma narrativa sólida,  estrategicamente ancorada nas redes sociais. O Facebook era usado por 57% dos eleitores de Bolsonaro, contra 40% de Haddad, por exemplo. No WhatsApp, o candidato do PSL se comunicava com 61% de seu eleitorado, contra 38% do concorrente do PT. O presidente eleito tinha a maior base que compartilhava conteúdo sobre política e eleições, em ambas as plataformas, entre todos os candidatos: 31% no Facebook e 40% no WhatsApp (Haddad com 21% e 22%, respectivamente).

 Outro ponto de destaque:  acabou o “político sabonete”, que fica em cima do muro. O eleitor não tolera mais quem não se posiciona diante dos principais temas do Brasil, mesmo polêmicos. E o político, hoje, paga um preço alto pelo silêncio, principalmente nas redes sociais.

 A propaganda na TV continua sendo importante, mas perdeu seu reinado, principalmente se a estratégia não for certeira. O candidato Henrique Meireles, que tinha um dos maiores tempos e gastou R$ 40 milhões na campanha, teve praticamente a mesma votação do Cabo Daciolo, que tinha segundos e gastou cerca de R$ 2 mil.

Em tempos de TV a cabo, Netflix e Youtube, o eleitor não tem mais paciência para assistir a propaganda eleitoral na TV, que tem uma linguagem massiva, chata e que não dialoga com segmentos. O eleitor é ‘egoísta’ por natureza e quer saber o que exatamente fará diferença na sua vida, algo que ele encontra nas redes sociais, quando o político adota uma estratégia de segmentação eficiente e atraente, contando uma história. Rede social é entretenimento e relacionamento.

 E, se o eleitor/seguidor escolheu as redes sociais como importante fonte de informação, o político também reforçou o protagonismo delas. Sinal dos novos tempos, pela primeira vez na história um presidente eleito não deu o primeiro discurso para a imprensa tradicional, mas usou uma live no Facebook e tem usado os canais digitais para dialogar diretamente com o eleitor. Contudo, os governos precisam manter uma relação saudável com a mídia tradicional, reforçando a transparência dos atos e seu caráter mediador. Por fim, as Fake News, que marcaram negativamente a campanha na internet, devem merecer ainda maior atenção das autoridades, da população e comprometimento das próprias plataformas. Sua proliferação, hoje, é um dos maiores problemas enfrentados pela democracia e deve ser combatido com todas as forças.

 Faltando dois anos para as eleições municipais, a classe política tem a oportunidade de refletir sobre este novo cenário, reavaliando práticas e começando a dialogar, desde já, com este novo eleitor. Não adianta ‘puxar papo’ só em ano eleitoral. Hoje, mais do que nunca, o relacionamento com o eleitor precisar ser permanente, transparente, espontâneo e sem fugir da raia.

 

 

Marcelo Tolentino, Jornalista, com formação em Marketing Político Digital e assessor de comunicação

 

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